O Alentejo é ainda mais bonito com chuva

TEXTO E FOTOGRAFIA POR VERA TEIXEIRA DA COSTA

Um lugar que lembra as palavras de Walter Benjamin, quando este disse que a autenticidade não é passível de reprodução. Sente-se exatamente isso quando estamos dentro da Casa no Tempo. Sente-se. E é tão bom isto de sentir. Nesta herdade, Casa no Tempo representa a ideia de um mundo perfeito: é um espaço a perder de vista, onde a primeira perceção é a de que cada detalhe é arquitetado de forma cuidada, emocional, e até poética. A paisagem lembra uma das cenas do filme O Espelho, de Andrei Tarkovski, em que Margarita Terekhova está sentada numa cerca a olhar o horizonte. É uma imagem fria, magnífica. Talvez, uma das mais icónicas do cinema.

Assim que entramos na Herdade, imergimos na natureza. Há qualquer coisa de etéreo ali. É como se entrássemos numa dimensão qualquer onde a verdadeira beleza da vida se revela como uma paz profundamente intensa, poderosa, quase tangível.

A canção Life de Sakamoto, na qual David Sylvian entoa Life is a wonder of wonders, ecoa na cabeça. Sim, há uma vida maravilhosa na Herdade no Tempo – na sua permanência e amplitude. O tempo intercorre entre a herdade e uma casa numa espécie de equilíbrio e beleza, assumindo uma estética sublime pontuada pela consistente intervenção do arquiteto Aires Mateus.

Dentro da casa, observamos a candura sofisticada de cada objeto e a forma como se encaixam no espaço. Um espelho imperioso, com uma moldura majestosa e dourada, recebe-nos como se de um elemento vivo que nos acolhe se tratasse. A Maria José e a Cláudia fazem um delicioso chá quente. Chove lá fora. Observamos através das enormes janelas a Xarel, uma égua branca, que se desloca livre e lentamente por entre a neblina. Ouve-se Lately, dos Memoryhouse, vindo da coluna de som que está na sala e que se propaga por toda a Casa.

Fabiana Tavares, realizadora de cinema, está sentada no sofá. Come chocolates e bebe vinho. Diz ter encontrado inspiração para o argumento do seu próximo filme. Aqui tudo flui. Aqui tudo é perfeito. O tempo mostra-se como uma gradação de luz, e é essa a sua única evidência. Não existem ponteiros do relógio a reclamar atenção. Pode dizer-se que aqui, a vida apresenta-se como um manto sensorial e orgânico. No escuro da noite, a casa fica ainda mais bonita com aquele jogo de luz e sombra que nos conforta e aconchega. À mesa, celebramos a vida com um brinde. Porque na Casa no Tempo percebemos que tudo é, afinal, para ser celebrado.