
A Villa Romana de Milreu, em Estoi no Algarve, é o testemunho de uma vila rústica habitada desde o século I d.C., mas principalmente de habitações de prestigiadas famílias de elevado estatuto social e político, com uma forte componente de vivência lúdica. A área de Estoi era abundante em nascentes de boa água, que fertilizavam as hortas e satisfaziam as necessidades de toda a área envolvente, facto que terá sido preponderante para a ocupação continuada da zona desde o século I até ao século XI. A enorme quantidade de vestígios desse tempo, encontrados por Estácio da Veiga, através de escavações arqueológicas em 1877, representa uma descoberta determinante para o entendimento do requinteda forma de viver das famílias de classe alta.

“É um grande erro ter, em vida, uma casa bem fornecida e não se ocupar daquela onde teremos de habitar mais tempo.”
Petrónio Gaius Petronius Arbiter
Escritor, político, senador, governador e cônsul romano I d.C.


Mosaicos, revestimentos marmóreos e cerâmicos diversos e estuques pintados constituem um importante testemunho, bem como um vislumbre da sofisticação e qualidade estética.

As paredes das divisões mais nobres eram revestidas por ricos mármores e cantarias sob a forma de pilastras adossadas às paredes, encimadas por capitéis coríntios e elementos naturalistas. Nos espaços intermédios, as paredes estucadas apresentavam pinturas feitas a fresco.
Em Milreu, o estuque pintado está muitas vezes perdido, mas ainda é possível observar alguns vestígios da decoração parietal.

A partir do século III d.C., acentua-se o gosto pelos costumes orientais e a decoração da casa traduz ostentação. Utilizam-se mármores de várias cores que chegavam a revestir toda a superfície de uma sala. Contratavam-se artistas, que circulavam por todo o império, levando consigo as novidades e a arte produzida em Roma.
A arte praticada na capital do Império era seguida nas províncias como uma forma de, localmente, demonstrar o apoio ao imperador e a Roma.

Embora Milreu não tenha a imponência nem as grandes dimensões de Conímbriga, ou até de Miróbriga, é sem dúvida um local encantador e de grande interesse. A visita a esta vila com 20 séculos permite observar uma intenção vivencial e cultural, tanto no que respeita à organização estrutural como à decoração dos seus espaços. Um gosto e um estilo de vida à imagem do império permitem ao cidadão rico reconhecer-se na identidade cultural da longínqua Roma.

Os telhados das casas eram feitos com telhas de cerâmica. A riqueza da Villa Romana de Milreu manifesta-se no importante volume de achados arqueológicos, como os mosaicos de temática maioritariamente aquática, os revestimentos marmóreos e cerâmicos, os estuques pintados e a escultura decorativa. É um monumento de luxo secular que espelha a elegância e o aprumo de uma era há muito desaparecida, proporcionando uma viagem no tempo ao lifestyle da época dos grandes imperadores romanos.

“A primeira coisa que se deve fazer é escolher um lugar saudável (…).
A utilidade que requer a natureza dos locais consiste em escolher aqueles onde o ar e as águas são mais saudáveis (…),sendo de tomar precauções para que os quartos onde se dorme e as bibliotecas sejam orientadas para levante: que os banhos e compartimentos de inverno sejam a poente e que os gabinetes de quadros e outras curiosidades que necessitem de um dia sempre igual sejam orientados a setentrião.”
Marco Vitrúvio Polião Arquiteto
Os Dez Livros de Arquitectura de Vitrúvio I a.C.

Por Susana JAcobetty. Fotografia João Bettencourt Bacelar. Design Francisco Costa. Tipografia Guilherme Clichê.